domingo, 24 de fevereiro de 2008

Aula 2: INTERPRETAÇÃO DE TEXTO

Senhores e senhoritas,

Como se compreende um texto?

Alguns , dos meus alunos, imaginam que, quando lemos, vamos unindo uma palavra com a outra e , dessa forma, abstraímos a informação do texto. Todavia, o significado do texto não é depreendido somente através dos elementos explícitos. Para você entender um texto, não se esqueça de construir a lógica que relaciona as informações apresentadas, elaborando as partes de sentido que ligam as várias informações. Como fazer isso? A princípio, você deve conectar as partes para dar coerência ao conjunto, porque, quando lemos, observamos que há o explícito e o implícito. Nem tudo é dito claramente. Precisamos deduzir e completar o que não está no texto. Se não está no texto, onde está? Em seu conhecimento de mundo. Acrescente conhecimentos extras ao que vem dito literalmente. Essas informações, fornecidas por você, servem para criar a lógica do texto. São, também, essenciais para a compreensão daquilo que o autor quer comunicar.
Veja um exemplo simples:
I - O carro de Rubião foi arrombado. Ele está pensando em comprar um alarme.
Esses dois períodos se relacionam por um conjunto de informações não expressas explicitamente: - quem tem o carro arrombado pode querer buscar mais segurança; um alarme pode proteger carros; o carro não será mais arrombado, etc
II- Amanhã, segunda-feira, Rubiãozinho vai buscar o avô. O velhinho precisa de companhia.
Quem é o velhinho? O texto não esclarece, não é? Tal informação exige o conhecimento de mundo. Você passa a inferir relaçoes não especificadas. Você precisa completar o que não está dito no texto. Então, qual é o referente? Não há problemas, pois nosso conhecimento prévio nos garante dizer que o 'velhinho' é o avô de Rubiãozinho. Na nossa cultura, avô é = velhinho.
Assim sendo, com base nas informações do texto e com base nas suas informações, você constrói inferências, isto é, informações extras para o texto. Interpretar texto exige sempre uma leitura nas entrelinhas. Compreender um texto envolve, pois, o que se percebe de explícito e o que você insere no texto.
PS.: Quando o texto do vestibular trouxer uma relação que se distancie da lógica, como, "O carro de Rubião foi arrombado. Ele está pensando em comprar um gatinho."
Que faremos? É mais fácil entender o texto em que aparece o alarme do que o que apresenta o gatinho. Todavia, se o autor escreveu isso é porque acredita numa possível relação. Ou é louco! Para compreendê-lo, deve, pois, percorrer um caminho maior. Até mais!

CONCEPÇÃO DE INFÂNCIA I. 7º termo de Pedag.

Alunas,

Ao falarmos em infância, não devemos omitir a presença de, pelo menos, dois grandes grupos, a saber, o defensor das idéias agostinianas e cartesianas; outro, não menos importante, amalgamado ao pensamento de Rousseau.
Santo Agostinho viu a infância submersa no pecado, pois a criança estava despojada da razão. Nesta perspectiva, Descartes comparou a criança a alguém que vive uma época do predomínio da imaginação sobre a razão. A criança é, para esses autores, um momento de turbulência. A infância é um período de terror. Quanto mais cedo saíssemos da condição de criança, melhor seria para a humanidade.
Rousseau, entretanto, trouxe outra visão sobre a infância. Esta passa a ser vista como o centro da inocência e da pureza. Ela é uma etapa necessária para o acolhimento da verdade e para a participação no que é moralmente correto. É, pois, um bem ao homem."Oh! que saudades que tenho da aurora da minha vida, da minha infância querida que os anos não trazem mais!"
A literatura, entre os séculos XIX e XX ,apresentará novas concepções de infância. Senão vejamos: o conto AS AVENTURAS DE PINÓQUIO, de Carlo Collodi, vai mostrar a infância como algo obtido por construção e, sobretudo, na relação estreita com a escola. Gepeto recebe um pedaço de pau falante e o transforma em boneco. O importante, pois, é perceber que Pinóquio de Collodi não é essencialmente mau nem bom, é apenas um boneco de pau. Uma nova concepção de infância é ensaiada. A infância, em Collodi, apresentará indícios, os quais serão recuperados, predominantemente, por Philippe Ariès, no início dos anos 60, sob o conceito de a descoberta da infância ou invenção da infância. O que há, portanto, de fundamental a salientar é que a infância passará a ser vista como algo dependente da construção histórica. Vamos conversar sobre a infância em Collodi e Ariès?
Então, até sexta-feira!

domingo, 17 de fevereiro de 2008

ARTE DE ESCREVER 2

Na língua falada, é comum obtermos, como resposta, uma idéia abstrata: "Por que você estuda?"(...) "porque preciso" ou "porque Deus quis"...
Ora, o texto escrito requer o conhecimento de algumas regras, com as quais você organizará um texto consistente. Lembre-se de que a dissertação envolve três princípios, quais sejam, exatidão, simplicidade e consistência.
É , igualmente comum, ouvirmos do vestibulando, principalmente, nos primeiros meses do ano, expressões, como, "Professor, não sei como começar". Senhorita, quem não sabe começar, desconhece o modo de desenvolvimento do texto e, sobretudo, ignora o processo de conclusão. Organizaremos, pois, um método de trabalho não como receita para a introdução do texto, mas, peculiarmente, com o intuito de ajudá-la a organizar o pensamento no papel. Saiba, também, que a construção de seu texto dissertativo exige o conhecimento de estratégias de argumentação. Argumentar significa apresentar e defender idéias. Envolve, também, o domínio de premissas ou evidências. Uma forma básica de argumentação pode ser estruturada em função de quatro etapas:
I - Apresentar a TESE e sua importância. (de que estou falando? Por que se está falando?) ernaldicando: é melhor fazer uma breve introdução, na qual o tema é localizado no tempo e/ou espaço. Pode também, mostrar a importância do tema em função do assunto a que se refere;
II- Oferecer provas/argumentos que confirmem a tese. Coloque-os em ordem crescente de importância a fim de conquistar o leitor;
III- Não se esqueça de exibir contra-argumentos (idéias que possam contrariar a própria tese com o propósito de refutação);
IV - Exibir a Síntese.
Então, vamos redigir a partir de tais parâmetros?
A seguir, veja alguns itens de Arte de Escrever com os quais trabalharemos:
--Como defender um ponto de vista?
--Quais são os tipos de argumentação?
--Quais são os tipos de raciocínio?
--Como organizar as idéias?
--Como desenvolver as idéias?
--Como argumentar a fim de valorizar o raciocínio escolhido?
--Como evitar a reflexão superficial? (texto que explora superficialmente um tema)
--Como evitar a generalização?
--Como aprofundar o debate sobre o tema?
--Como fazer a refutação dos argumentos contrários?
--Quais são os critérios que garantem a qualidade do texto dissertativo?
Até mais!

domingo, 10 de fevereiro de 2008

ARTE DE ESCREVER 1

É opinião comum, entre meus alunos, o fato de que a redação esteja entre as tarefas mais difíceis do vestibular. O certo é que a matéria 'redação' não tem a seu favor um programa pré-estabelecido, organizado sistematicamente, por meio de tópicos, como ocorre, por exemplo, em Biologia ou outra disciplina caracterizada pela predominância da logicidade. Não menos certo é mostrar que Escrever bem envolve a construção de um estilo próprio, uma forma pessoal de lidar com a linguagem. Assim sendo, a ausência de um método cartesiano para pensar a redação torna-se fator determinante e profícuo para a aprendizagem do aluno. A redação tem, pois, a seu favor o ato criativo e a liberdade de elaborar a escrita a serviço do pensamento.
Em redação, meu papel, como professor, resume-se em desafiar o aluno a se superar sempre e sempre, a buscar estilo próprio e sentir o prazer do próprio texto. Ensinar a escrever redação deixa de ser, portanto, uma tarefa positivista na qual imponho meu método de construção de texto, minha metodologia como uma caixa de ferramentas e instrumento inibitório da criatividade do vestibulando.
Em minhas aulas, o aluno perceberá a necessidade de interagir-se com, pelo menos, três competências que são avaliadas num exame de REDAÇÃO dos grandes vestibulares. Senão vejamos:
a) Apreensão do tema posto em discussão;
b) Organização do raciocínio crítico (ninguém escreve bem sem saber bem o que escrever);
c) Busca de um estilo próprio de produzir o texto.
Antes de verificar se meu aluno já domina a estrutura dissertativa, minha opção é ajudá-lo a pensar criticamente; organizar um texto cuja presença seja demarcada pelo julgamento crítico.
Assim, escrever é pensar no texto, porém pensar criticamente. Como exercitar o pensamento no papel? Como pensar criticamente?
Na próxima aula, falarei sobre o processo de formação do raciocínio crítico.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Aula 1: INTERPRETAÇÃO DE TEXTO

O ensino de interpretação de texto nas escolas ainda está apoiado em concepção fundacionista sobre texto e sobre ensino. Tal concepção acredita que o texto possua uma natureza específica e que a interpretação verdadeira envolva a tentativa de esclarecer de algum modo a essência textual. Defende ainda a noção de que exista uma intenção do texto. Ora, se continuarmos a valorizar postura ocultista sobre textos, é melhor transformar nossas aulas em seminários sobre Peirce e Semiótica, pois conforme a sugestão de U.Eco, seguidor de Peirce, "reconhecer a intentio operis é reconhecer uma estratégia semiótica".
Assim sendo, nossas aulas se limitam a apresentar CHAVES para que o aluno, diante do vestibular, penetre na essência do texto. Tais chaves recebem nomes, como, coerência, coesão, antíteses, ambigüidades, implícitos, anáforas, entre outros. O ocultismo é tão grande que o principal livro de interpretação de texto chama-se: "DESVENDANDO OS SEGREDOS DO TEXTO". Dessa forma, interpretar não é tarefa a qualquer mortal. É um milagre.
Ora, devemos desconfiar da idéia estruturalista de que saber mais sobre os "mecanismos textuais" represente o sucesso do aluno. O importante é conduzi-lo a perceber que ler textos é, sobretudo, uma questão de lê-los à luz de outros textos, pessoas ou informações; é o resultado de um confronto com um autor, personagem, estrofe ou verso. Esta aula sobre o texto usa o autor ou o texto não como busca à intentio operis, mas como ocasião para abandonar uma resposta anteriormente aceita, ou para dar um outro tom a uma história já contada. INTERPRETAR, não significa carregar chaves verdadeiras. INTERPRETAR É PENSAR.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

Carnaval e Quarta-feira de cinzas

Do latim temos a expressão carnelevamen, a qual nos remete aos prazeres da carne. Deonísio da Silva nos diz "antes de o Carnaval ser a festa que é, chavama-se entrudo (do latim introitu, entrada), porque aqueles três dias são a porta de entrada para a Quaresma."
Não podemos, porém, esquecer que os italianos chamam a Semana Santa de Settimana Grassa, e, consequentemente, a quarta-feira de martedí grasso, deixando-nos a idéia de que o tempo é, sobretudo, gorduroso. Cinzas sobre a cabeça gordurosa.
Não nos esqueçamos, igualmente, do viajante Charles Dent, que, ao presenciar o carnaval de 1884, considerava perplexo: "todo mundo parecia ter perdido a cabeça".
Todavia, fiquemos com o mestre MACHADO DE ASSIS, segundo o qual "Carnaval é o momento histórico do ano. Paixões, interesses, mazelas, tristezas, tudo pega em si e vai viver em outra parte"(A SEMANA, 16 de fevereiro de 1896).

Assim sendo, ocupemo-nos da Quarta-feira. Esta à porta!
Não vos peço que não ameis o carnaval, pois sei que amais; mas só que reconheçais a Quarta-feira de Cinzas, porque sei que não reconheceis.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

Carnaval e Febre Amarela em Machado de Assis.

"Ei-lo que chega...Carnaval à porta!...Diabo! aí vão palavras que dão idéias de um começo de recitativo ao piano; mas outras posteriores mostram claramente que estou falando em prosa; e se prosa quer dizer falta de dinheiro (em cartaginês, está claro) então é que falei como um Cícero.
Carnaval à porta. Já lhe ouço os guizos e tambores. Aí vêm os carros das idéias...Felizes idéias, que durante três dias andais de carro! No resto do ano ides a pé, ao sol e à chuva...Mas lá chegam os três dias, quero dizer os dois, porque o de meio não conta; lá vêm, e agora é a vez de alugar a berlinda, sair e passear.
Nem isso, ai de mim, amigas, nem esse gozo particular, único, cronológico, marcado, combinado e acertado me é dado saborear este ano. Não falo por causa da febre amarela; essa vai baixando. As outras febres são apenas companheiras...Não; não é essa a causa.
(...) -Falta-me prosa..."(Bons Dias, 27 de fevereiro de 1889).


Há, com certeza, muitas coisas a pensar sobre esta crônica. O que se pretende, neste espaço, é mostrar um texto machadiano carregado de 'agoras' ou antecipando nossos dias: carnaval

domingo, 3 de fevereiro de 2008

O menino é o pai do homem

Senhores:

Investindo-me no cargo de presidente, quisestes começar a Academia Brasileira de Letras pela consagração da idade. Se não sou o mais velho de nossos colegas, estou entre os mais velhos. É simbólico da parte de nossa instituição que conta viver, confiar da idade funções que mais de um espírito eminente exerceria melhor. Agora que vos agradeço a escolha, digo-vos que buscarei na medida do possível corresponder à vossa confiança.”


TEXTO PROFERIDO NA INAUGURAÇÃO DA ABL 20/7/1897PEQUENO TEXTO E INFINIDADES DE INFORMAÇÕES E SUGESTÕES AO NOSSO TEMPO! OU NÃO!

O jovem e Machado de Assis 3

O jovem tímido, como a própria vida do mestre, desceu seus lábios sobre a mão do escritor; Inclinou seu coração ao aconchego da mão do mestre que, à beira da morte, não mostrava angústia. Enquanto a mão do mestre tocava-lhe o peito, o capítulo XXVI de Esaú e Jacó invadia o quarto com a lição que selaria aqueles dois homens que calados se contemplavam: “Era a paz perpétua; mais tarde viria a perpétua amizade”. Na rua, alguém a perguntar: - Onde encontrar a sabedoria?

Respondia, com o coração ardente, -No quarto de Machado de Assis. E ao perguntarem sobre o que presenciou sobre a morte, não omitiu as palavras do cronista ao seu ouvido: “A monotonia é a morte. A vida está na variedade”(A SEMANA, 18/5/1893). Indagavam outros: - E a morte de Machado? Respondia:
–”Nem era morrer; era um gesto de chapéu, que se perdia no ar com a própria mão e a alma que lhe dera movimento. Um cochilo”
Eis a lição sobre a morte, a morte de Machado de Assis.

O jovem e Machado de Assis 2

Na noite em que faleceu Machado de Assis, um jovem desconhecido, ao entrar no quarto do doente, não emitiu palavras, lembrando a crônica do mestre de 13/12/1896, na qual o cronista dizia “eu poupo as palavras”; não viu uma paisagem fúnebre naquele quarto; antes, lembrou-se do cronista de “Uma Semana”, segundo o qual “só a beleza intelectual é independente e superior. A beleza física é irmã da paisagem”.
Enquanto alguns companheiros de Machado viam os últimos suspiros, o jovem tímido abstraía, pelo menos, duas lições fundamentais, a saber, a origem da sabedoria e a concepção de morte. Quanto à primeira, não percebeu ali uma sabedoria cunhada pelo Livro de Jó, isto é, proveniente do sofrimento; ao contrário, veio-lhe à mente as palavras em ‘Memorial de Aires, 24 de agosto de 1888′: “Tudo é fugaz neste mundo. Se eu não tivesse os olhos adoentados dava-me a compor outro Eclesiastes , à moderna, posto nada deva haver moderno depois daquele livro. Já dizia ele que nada era novo debaixo do sol”

O jovem e Machado de Assis l


Na noite em que faleceu Machado de Assis, reuniam-se, na sala principal, alguns poucos nomes, entre os quais, Coelho Neto, Graça Aranha, Mário de Alencar, José Veríssimo, Raimundo Correia e Rodrigo Otávio.
Surpreendentemente, ouviram-se lentas pancadas na porta principal da casa. Abriram-na. Não era um grande nome da época. Um adolescente, aproximadamente 18 anos. Tímido. Não era conhecido por ninguém ali. Na verdade, não conhecia o próprio dono da casa, senão pela leitura de suas crônicas e outros textos. O certo é que o jovem foi conduzido por uma boa alma ao quarto do doente. Entrou. Não disse uma palavra. Simplesmente, ajoelhou-se. Tomou a mão do mestre; beijou-lhe ternamente. Em sinal de gratidão singular, levou-a mansamente ao peito. A mão do mestre tocou-lhe o peito juvenil. Sem dizer uma palavra, levantou-se e saiu. O mestre levou o encanto do rapaz, este carregou pelas ruas e pela vida o canto do mestre. José Veríssimo, comovido, perguntou-lhe o nome: Astrojildo Pereira. Um moço que estava representando todo o desejo de nossa geração.