sábado, 27 de março de 2010

A ARTE DA PALAVRA À MANEIRA DE MACHADO DE ASSIS

Senhores  e  senhoritas,

A  ARTE DA  PALAVRA  implica  apaixonar-se pelas palavras. O crítico literário Harold Blom  explica que a  grande escrita  é  sempre  reescrita, isto é,  um bom texto  sempre  precisa ser  reescrito. O  poeta  francês Paul Valéry  dizia que  os  deuses nos dão  o primeiro verso, mas que o restante do poema nós mesmos temos que  encontrar. Aproveite  a  crônica  machadiana a  fim  de  elevar o manancial da escrita.


Machado de Assis: 12/03/1893

QUE CUIDAM que me ficou dos últimos acontecimentos Amazonas? Um verbo: desaclamar-se. Está em um dos telegramas do Pará e refere-se ao cidadão que, por algumas horas, estivera com o poder nas mãos. "Tendo em ofício participado a sua aclamação marcado o prazo de 12 horas para a retirada do governador, de clamou-se em seguida por outro ofício. . ."

Pode ser (tudo é possível) que o intuito da palavra fosse ante gracejar com a ação; mas as palavras, com os livros, têm os seus fados, e os desta serão prósperos. É uma porta aberta para as restituições políticas. Resignar, como abdicar, exprime a entrega de um poder legítimo, que o uso tornou pesado, ou os acontecimentos fizeram caduco. Mas, como se há de exprimir a restituição do poder que a aclamação de alguns entregou por horas a alguém? Desaclamar-se. Não vejo outro modo.

Mérimée confessou um dia que da história só dava apreço às anedotas. Eu nem às anedotas. Contento-me com palavras. Palavra brotada no calor do debate, ou composta por estudo, filha da necessidade, oriunda do amor ao requinte, obra do acaso, qualquer que seja a sua certidão de batismo, eis o que me interessa na história dos homens. Desta maneira fico abaixo do outro, que só curava de anedotas. Sim, meus amigos, nunca me vereis vencido por ninguém. Alta ou baixa que seja uma idéia, acreditei que tenho outra mais alta ou mais baixa. Assim o autor da Crônica de Carlos IX dava Tucídides por umas memórias autênticas de Aspásia ou de um escravo de Péricles. Eu dou as memórias deste escravo pela notícia da palavra que Péricles aplicava, em particular, aos cacetes e amoladores de seu tempo.

Que valem, por exemplo, todas as lutas do nosso velho parlamentarismo, em comparação com esta palavra: inverdade? Inverdade é o mesmo que mentira, mas mentira de luva de pelica. Vede bem a diferença. Mentira só, nua e crua, dada na bochecha, dói. Inverdade, embora dita com energia, não obriga a ir aos queixos da pessoa que a profere. — "Perdoe-me V. Ex.a, mas o que acaba de dizer é uma inverdade; nunca o presidente da Paraíba afirmou tal cousa." — "Inverdade é a sua; desculpe-me que lhe diga em boa amizade; V. Ex.a neste negócio tem espalhado as maiores inverdades possíveis! para não ir mais longe, o crime atribuído ao redator do Imparcial. . . " — "São pontos de vista; peço a palavra."

Parece que inexatidão bastava ao caso; mas é preciso atender ao uso das palavras. Não cansam só as línguas que as dizem; elas próprias gastam-se. Quando menos, adoecem. A anemia é um dos seus males freqüentes; o esfalfamento é outro. Só um longo repouso as pode restituir ao que eram, e torná-las prestáveis.

Não achei a certidão de batismo da inverdade; pode ser até que nem se batizasse. Não nasceu do povo, isso creio. Entretanto, esta moça, pode ainda casar, conceber e aumentar a família do léxicon. Ouso até afirmar que há nela alguns sinais de pessoa que está de esperanças. E o filho é macho; e há de chamar-se inverdadeiro. Não se achará melhor eufemismo de mentiroso; é ainda mais doce que sua mãe, posto que seja feio de cara; mas quem vê cara, não vê corações.

Vi muitos outros viventes de igual condição, que mereceriam algumas linhas; mas o tempo urge, e fica para outra vez. Nem há só viventes separados; tenho visto irmãos, fileira de irmãos, saídos da mesma coxa ou do mesmo útero, com o nome de uma só família apenas diferençado pelo Sufixo, cuja significação não alcanço. Um exemplo, e despeço-me.

A chefia, e particularmente a chefia de polícia, é uma dona robusta, de grandes predicados e alto poder. Supus por muitos anos que era filha única do velho chefe; mas os tempos me foram mostrando que não. Tem irmãs, tem irmãos, tem chefação, pessoa de igual ou maior força, porque a desinência é mais enérgica. Tem chefança. Vi muitas vezes esta outra senhora, à frente da polícia ou de um partido, disputar às irmãs o domínio exclusivo, sem alcançar mais que comparti-lo com elas. Vi ainda a nobre chefatitra, tão válida e tão ambiciosa como as outras. Dos irmãos só conheço o esbelto chefiado, que, alegando o sexo, pretendeu sempre a chefança, a chefatura, a chefação ou a chefia da família.

Parece que, à semelhança dos filhos de Jacó, invejosos de José, que era particularmente amado do pai, os filhos e filhas do velho chefe, verido a predileção deste pela linda chefia, cuidaram de a matar. Estavam prestes a fazê-lo, quando surgiu a idéia de a meter na cisterna, e dizê-la morta por uma fera, como na Escritura; mas a vinda dos mesmos israelitas, com os seus camelos, carregados de mirra e aromas ...

Velha imaginação, onde vais tu, pelos caminhos do sonho? Deixa os camelos e a sua carga, deixa o Egito, fecha as asas, abre os olhos, desce; esta é a Rua do Ouvidor, onde não se mata José nem chefia; mas unicamente o tempo, esse bom e mau amigo, que não tem pai, nem mãe, nem irmãos, e domina todo este mundo, desde antes de Jacó até Deus sabe quando.

Para crônica, é pouco; mas para matar o tempo, sobra.

Até mais!



domingo, 7 de março de 2010

DIA DA MULHER CONFORME MACHADO DE ASSIS

  Senhores  e senhoritas,


Machado de Assis  trouxe  relevo  à figura da mulher  nos  seus  escritos.
 Vejam as  principais  mulheres de Machado  e  suas  qualidades.



O  QUE  A  MULHER  PRECISA  SABER   PARA  SER FELIZ?


a)  Lívia (1872):  dela  partiu  a  decisão  de  romper com a decisão de casamento.


b) Guiomar (1874): em  A mão e A luva,  escolhe Luiz Alves para que este lhe seja, sobretudo, útil.


c) Estela (1878):   em  Iaiá Garcia,  conduz  a  ação  e  promove  situações de felicidade para Luiz Garcia, Iaiá  e  Jorge.



d) Helena (1876):    para  não  ser  interpretada como aventureira, deixa-se morrer.

 

e) Virgília  e  Marcela (1881): em MPBC, Virgília foi a primeira a mostrar a cura das doenças nervosas decorrentes do casamento.
Marcela... a condutora da ação:  amou-me durante quinze meses e 11 contos de réis...


f) Sofia(1891): em Quincas Borba,  a mulher  é o elemento forte, traz o homem dependente de si.


g) Capitu (1899) em D.Casmurro, símbolo da mulher. Em Machado,  a  mulher  pode escolher a forma  de  sentir e  amar.O homem  sem  Capitu  não  é  nada.


h) Flora (1904): em Esaú e Jacó,  sensibiliza-nos, comove-nos, aparece e desaparece mansamente, morre sem perturbar-nos.


i) Fidélia  e  D.Carmo (1908): em M.Aires,  representam a dependência do  homem em tudo.
 "Aguiar sem Carmo não é nada". Representam, igualmente, dedicação à família  e  à vida.


 Machado  escrevia sobre mulheres e para mulheres.

VEJAM MAIS:

1 - "...não basta ver uma mulher para a conhecer, é preciso ouvi-la também..." (Ressurreição,cap.III)

2 - "A mulher, dizia ele, é um livro; o pé  é o índice do livro" (Histórias românticas, Ed. Jackson)

3- "pela adulação é que se alcançam as mulheres, bem como se as perde, tal como acontece com os reis" (Queda que as mulheres têm para os tolos", Miscelânea)

4- "as mulheres escolhem com pleno conhecimento do que fazem. Comparam, examinam, pensam, e só se decidem por um, depois de verificar nele a preciosa qualidade que procuram. Essa qualidade é...a toleima!" (Queda que as mulheres têm para os tolos", Miscelânea)

5- "como mulheres, sabem que  a  ousadia é a primeira virtude masculina" (Crítica teatral, Ed. Jackson).

Que sejamos felizes  com  as  mulheres!

Até mais!